100 anos do anjo pornográfico:Nelson Rodrigues

Centenário de Suzana Flag ou Nelson Rodrigues. Em comemoração novas montagens de suas peças, exposições e homenagem na Feira Literária de Olinda marcam seu centenário de nascimento do anjo pornográfico

Nascido Nelson Falcão Rodrigues, em Recife PE, em 23 de agosto de 1912, conheceu o sucesso na literatura como Vestido de Noiva, 1943, Nelson cria um artifício dividindo a ação em três planos - da memória, alucinação e realidade com a encenação do polones Ziembinski, que marcou o nascimento do teatro moderno no Brasil. Anjo Negro, de 1948, obra ousada e montagem idem para a época, foi levada no Teatro Brasileiro de Comédia (TBC), SP. Suas peças trazem uma evidente carga psicológica, em que o jogo neurótico invade e transforma as relações, a mesma condição é repetida em A Mulher sem Pecado, o ciúme é o fio condutor.

No texto 'Em Álbum de Família', obra de 1945, ele elabora um mergulho radical na inconsciência primitiva de suas personagens, que se tornam arquétipos, trabalhando sua narrativa sobre as verdades profundas e inimagináveis do ser humano a partir da célula da família. Aqui o tema se aloja em um dos maiores tabus sociais - o incesto em todas as direções, entre irmãos, mãe e filho, pai e filha.

A sua temática começa a gerar uma rejeição à sua obra por causa de motivação eminentemente moral, começa com a censura a algumas de suas peças. Álbum de Família, só seria encenada 22 anos depois de escrita. Anjo Negro, de 1946, sofre tentativas de censura religiosa.

Em 1950, com Dorotéia. A encenação e o texto, da intitulada "farsa irresponsável" pelo autor, não são compreendidos pelo público, saindo rapidamente de cartaz. Em 1951 é a vez de Valsa Nº 6, um monólogo em que uma jovem de 15 anos, golpeada mortalmente, recupera, em estado de choque, o mundo a sua volta. A peça é escrita para ser interpretada por Dulce Rodrigues, irmã do autor, e é dirigida por Henriette Morineau.  No ano de 1953, A Falecida, primeira tragédia carioca de Nelson Rodrigues retratando a peculiaridade da Zona Norte do Rio de Janeiro, é encenada por José Maria Monteiro, com a Companhia Dramátiva Nacional (CDN), no elenco Sônia Oiticica e Sérgio Cardoso.
Na seqüência, surge Senhora dos Afogados, escrito antes de Dorotéia e Valsa Nº 6, em 1947, cuja montagem aconteceu no TBC. A causa do horror do público é outra vez a relação incestuosa, o amor da filha pelo pai, que faz com que a mãe se vingue traindo o marido com o noivo da filha, motivando assassinatos entre os membros da família. Assim foi a longeva vida do jornalista, escritor Nelson Rodrigues, o anjo pornográfico.

Perdoa-me por me Traíres: a história de uma órfã adolescente que vive sob a repressão de um tio. A peça causa escândalo na cena carioca em 1957. Ainda em 1957, Nelson escreve Viúva, porém Honesta, outra "farsa irresponsável", sátira violenta tendo como alvo os jornalistas e a crítica especializada.

Os Sete Gatinhos: a divina comédia", retoma o tema de família suburbana carioca, agora se decompondo drasticamente a partir da revelação de que a filha caçula, Silene, frusta as expectativas da família ao ser seduzida pelo malandro Bibelot. Em 1961,José Renato encena no TBC a próxima peça de Nelson, Boca de Ouro, escrita em 1959, e que, em 1969, tivera uma estréia mal-sucedida na mão de Ziembinski, que cismara em interpretar o papel-título.

O Beijo no Asfalto é escrita sob encomenda de Fernanda Montenegro. Em 21 dias, o autor apresenta mais uma de suas tragédias cariocas, agora abordando a sordidez não só da imprensa, mas também da polícia, numa trama forjada que destrói a reputação de um homem, acusado de homicida e homossexual.  Em 1962, Otto Lara Resende ou Bonitinha, mas Ordinária. A trama gira em torno das hesitações de um humilde contínuo, entre casar-se com a filha de um magnata e vítima de um estupro bárbaro, ou manter-se fiel a seus sentimentos por uma prostituta pobre que sustenta a mãe louca e as três irmãs.

Toda Nudez Será Castigada, 1965, tem novamente Ziembinski na parceria. A peça conta a história de um homem conservador que se apaixona por uma prostituta, que acaba por traí-lo com o próprio filho. Em 1967, é a vez de subir a cena a terceira peça de Nelson, Álbum de Família, escrita em 1945 e logo proibida pelos censores. A última peça de Nelson Rodrigues, A Serpente, escrita em 1978, tem como temática duas irmãs casam-se no mesmo dia, uma é feliz no casamento e a outra não consegue sequer perder a virgindade em sua lua-de-mel. O espetáculo acaba por estrear em 1980, dirigida por Marcos Flaksman. do autor.

O escritor teve vinte de suas histórias transpostas para a tela do cinema, algumas em duas versões, como Boca de Ouro, de Nelson Pereira dos Santos, 1962, e de Walter Avancini, 1990, e Bonitinha, mas Ordinária, de R. P. de Carvalho, 1963, e de Braz Chediak, 1980. Algumas das realizações mais bem-sucedidas são A Falecida, de Leon Hirszman, 1965, e O Casamento, de Arnaldo Jabor, 1975.

Suas crônicas para O Jornal, sob o pseudônimo de Suzana Flag, são publicadas em livros, como Meu Destino é Pecar, As Escravas do Amor e O Homem Proibido. Escreve também para os periódicos Última Hora, Flan, Correio da Manhã, O Globo e Manchete Esportiva. Assinando artigos sobre esporte, não priva o leitor de seu estilo dramático, atendo-se muitas vezes ao sentido da rivalidade, ao significado do gol, ao efeito do suor sobre a subjetividade da platéia brasileira. O dramaturgo faleceu em 21 de dezembro de 1980, aos 68 Rio de Janeiro. Confira programação de centenário e peças teatrais em cartaz: http://formasemeios.blogs.sapo.pt/tag/centen%C3%A1rios